Entrevista com Leonardo Fuks
Leonardo Fuks, o irreverente inventor que criou uma orquestra em cima de bicicletas, pedalou pelo ArteForum no domingo, 5 de junho de 2011. Único doutor em Acústica Musical no país, o pesquisador carioca possui formação acadêmica em Acústica Musical e Engenharia, o que lhe permite…
Leonardo Fuks, o irreverente inventor que criou uma orquestra em cima de bicicletas, pedalou pelo ArteForumno domingo, 5 de junho de 2011. Único doutor em Acústica Musical no país, o pesquisador carioca possui formação acadêmica em Acústica Musical e Engenharia, o que lhe permite dialogar constantemente entre conhecimentos práticos e teóricos, visando ao desenvolvimento instrumental e musical.”Aquilo de que precisamos [a Cyclophonica] para funcionar, para tocar adequadamente, tornando-nos audíveis e inteiros numa cidade, já é uma pauta prática de reivindicações.”
1.FCC – Como foi a interação com os pacientes do IPUB? Foi uma surpresa para os integrantes da orquestra uma participação tão ativa? Como foi a sensação de realizar um concerto para pacientes? Qual foi a diferença com relação ao público que esteve em frente à fachada da UFRJ?
Foi muito especial ter esse contato com os pacientes psiquiátricos. Inicialmente, porque são pessoas muito sensibilizadas para as artes, suponho que estimulados pelos processos e vivências terapêuticas lá desenvolvidas. Depois, porque tudo que a Cyclophonica tem de “bizarro”, “maluco” ou “excêntrico” foi recebido com a maior tranquilidade e naturalidade pelos pacientes, pois eles entenderam que nós estávamos lá exclusivamente para tocar para eles e, sobretudo, com eles. O grupo Cancioneiro, coordenado pelo musicoterapeuta Vandré Talita, é um belo trabalho e foi perfeito o encontro, pois diversas músicas foram acertadas antecipadamente, todas do repertório conhecido pelos pacientes.
Quando concluímos nossa participação no IPUB (com certo atraso), já eram quase 11 horas da manhã e decidimos incluir o Trem das Onze e todos tocaram ou cantaram: foi ainda mais perfeito do que poderíamos imaginar!
Em seguida, rumamos para a entrada do Fórum (onde outrora funcionava um grande hospício) e fomos recebidos por um público bem mais contido, porém muito receptivo e caloroso. Foi outra emoção, sobretudo pelo tapete de serragem colorida, belíssimo, que os artistas fizeram!
2.FCC – O que foi mais marcante nessa apresentação realizada no domingo, 5 de junho? Houve algum momento inédito? Algo que nunca aconteceu nas apresentações de vocês?
Uma paciente insistiu para que tocássemos Metamorfose Ambulante, do Raul Seixas. Ela foi para o palco, pegou o microfone e cantou com tanta expressão e desenvoltura que, de fato, aconteceu uma metamorfose na frente de todos. Foi muito bonito. Uma outra paciente compartilhou os tambores com nosso percussionista, tocando de forma bem ritmada e com um semblante de grande alegria e entrega. Estes momentos podem ser vistos nos vídeos que fizemos. Mas, certamente, o momento mais forte foi quando todos tocamos e cantamosMaluco Beleza. Ficamos muito emocionados, difícil de explicar. Todos da Cyclophonica e da plateia tínhamos lágrimas nos olhos, [fruto] de um sentimento muito bonito e raro.
3.FCC – Houve alguma diferença pelo fato da apresentação ter sido realizada na UFRJ, na Praia Vermelha?
Sem dúvida! Além de ser uma área universitária, com um público bem diferenciado e de ser o campus mais bonito da UFRJ é a “alma mater” da maioria dos músicos da Cyclophonica. O nosso grupo, atualmente com dez membros, nasceu dentro da UFRJ, estimulado por um congresso organizado pela Engenharia de Produção em 1999, com maioria de ex-alunos e professores da UFRJ. Ainda hoje, temos dois professores efetivos da [Escola] de Música da UFRJ, dois ex-professores substitutos e outros quatro ex-alunos da UFRJ. Aqui, estamos em casa.
4.FCC – Além de promover o aumento do respeito ao ciclista e de levar música e alegria a locais inusitados, o que mais desejam os músicos-ciclistas?
Nós não temos exatamente uma plataforma política verbal. Aquilo de que precisamos para funcionar, para tocar adequadamente, tornando-nos audíveis e inteiros numa cidade, já é uma pauta prática de reivindicações. Havendo desrespeito ao ciclista, não conseguimos fazer a nossa música, pois as buzinas e as manobras desleais de outros veículos maiores nos deixam totalmente incapacitados. Se roubam nossas bicicletas, não haverá concerto. Se o nível de ruído urbano for alto, nem chegamos a nos escutar. Se desrespeitarmos os pedestres, teremos uma péssima receptividade do público. Se não alegrarmos as pessoas e, sobretudo, as crianças, estaremos certamente tocando mal. Infelizmente, devido a práticas inadequadas de muitos ciclistas atuais, as bicicletas são vistas pelos pedestres como algo ofensivo e arriscado.
5.FCC – Que outro lugar gostariam de tocar e ainda não tiveram oportunidade?
Quer uma resposta bem curta? CHINA!
Rafael Barcellos
Jornalista do FCC/UFRJ
Edição: Zilda Martins