140 anos da Comuna de Paris – o reavivar do sentimento de luta e democracia


Nos dias 14 e 15 de setembro, o seminário sobre os 140 anos da Comuna de Paris lotou o salão Pedro Calmon. Organizado pela Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ), pelo Fórum de Ciência e Cultura (FCC), Laboratório de Estudos Marxistas (LEMA), entre outros, o…

Nos dias 14 e 15 de setembro, o seminário sobre os 140 anos da Comuna de Paris lotou o salão Pedro Calmon. Organizado pela Associação dos Docentes da UFRJ (ADUFRJ), pelo Fórum de Ciência e Cultura (FCC), Laboratório de Estudos Marxistas (LEMA), entre outros, o evento promoveu debates e atividades culturais sobre o legado do primeiro governo operário da história do pensamento comunista.

Na conferência de abertura, Claudine Rey, presidente da Association les Amis de la Commune de Paris, apresentou a Comuna de Paris em perspectiva histórica e a defendeu como elemento de memória, de formação política para luta e exemplo de poder do povo, para o povo e pelo povo. A relevância dos 72 dias da Comuna fica evidente diante do caráter da universalização conferido pela participação de estrangeiros no combate e que passaram a ser considerados cidadãos, por exemplo.

140 anos da Comuna de Paris o reavivar do sentimento de luta e democracia

Na mesa A Comuna nas obras de Marx, Lênin e Gramsci, os professores José Paulo Netto (ESS/UFRJ), Ronaldo Coutinho (UFF) e Carlos Nelson Coutinho (ESS/UFRJ) abordaram a influência do acontecimento histórico nas obras dos pensadores. Netto defendeu que Marx, mesmo achando o movimento prematuro, “o estimulou a pensar, pois considerou um exercício de democracia real e não um regime do terror, uma simples insurreição”. O objetivo de Marx não foi criticá-lo, mas sim retirar lições daquela experiência.

Para Ronaldo Coutinho, o importante é “manter o sonho vivo”, já que considera Lênin esquecido como pensador. Segundo Lênin, “não é a partir de um certo iluminismo dos intelectuais que haverá mudanças”. Já Carlos Nelson Coutinho acredita que, para Gramsci, mesmo com poucas referências à Comuna, “o movimento foi algo positivo, mas que ainda não era o momento de declarar extinta a burguesia”, assim como Marx considerava prematura a constituição da “ditadura do proletariado”.

Lançamento do livro A Revolução Antes da Revolução, de Karl Marx

Entre a primeira e a segunda mesa, Mauro Iasi, militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), promoveu o lançamento do livro A Revolução Antes da Revolução, de Karl Marx. A obra faz parte da coletânea Assim Lutam os Povos e tem como objetivo pensar a revolução proletária no contexto da efervescência das revoluções burguesas no mundo. Iasi brincou com o fato de estar divulgando uma mercadoria em um evento de reflexão socialista: “o livro não será entregue por devolução social porque ainda está na forma de mercadoria. Prometemos melhorar da próxima vez”.

140 anos da Comuna de Paris o reavivar do sentimento de luta e democracia

Discussão crítica sobre a causa operária

Na mesa O Poder popular e as organizações dos trabalhadores, Valério Arcary, dirigente do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), traçou um diagnóstico do proletariado contemporâneo. A grande maioria dos operários no Brasil não é socialista, diferentemente da década de 80, lamentou. O militante propôs uma polêmica divisão do pensamento marxista: o marxismo acadêmico de um lado e o marxismo militante do outro. “A maior parte dos marxistas acadêmicos não acredita no potencial transformador do proletariado e, às vezes, nem quer muito contato com a classe porque isso representa uma espécie de vigilância comportamental. Vou contar um segredo: a grande maioria dos acadêmicos é formada por extravagantes e excêntricos”.

Gilmar Mauro, militante do Movimento dos Sem-Terra (MST), acredita que o Brasil está entrando em uma fase de retrocessos nas conquistas operárias socialistas. Já Nikos Sekretakis, membro do Partido Comunista da Grécia (KKE), apresentou um panorama do movimento socialista no seu país, marcado por recentes crises.

A Comuna e a questão do trabalho

O segundo dia do seminário foi iniciado pela manhã com a mesa Trabalho, economia e autogestão operária. Marcelo Badaró, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), falou sobre a importância histórica da Comuna de Paris e a possibilidade da classe trabalhadora atuar como sujeito revolucionário.

Em outra perspectiva, Pedro Santinho deu como testemunho sua própria experiência como coordenador de uma fábrica ocupada. A Flaskô, na qual trabalhava, era uma empresa sediada em Sumaré (SP) que foi tomada por seus funcionários após ter decretado falência. Santinho acredita que ações como essa deveriam acontecer com mais freqüência: “estamos discutindo os 140 anos da Comuna sem debater a ocupação da Flaskô em nenhum lugar do mundo. Isso é motivo de lamentação”.

Já Mário Duayer, professor de Economia da UFF, discursou contra a centralidade do trabalho: “ao contrário das outras sociedades pré-capitalistas, é o trabalho que media as relações entre os sujeitos. Nossa sociedade nos reduz a sermos trabalhadores. Marx é contra a centralidade do trabalho. Só na sociedade capitalista há essa centralidade, o que é péssimo”.

A história do hino da Internacional dos Trabalhadores

A atividade cultural sobre a história da Internacional dos Trabalhadores realizada por Victor Neves, músico e doutorando da Escola de Serviço Social da UFRJ, apresentou o hino que “só pode ser entendido no quadro do cancioneiro revolucionário”. Ainda sem o conceito de unidade da classe, esse tipo de música contava as condições sociais, os problemas enfrentados na cidade, no campo e a condição de exploração de mais de 90% da população francesa.

Compositor da Internacional, Eugene Pottier era revolucionário, poeta e militante. Contemporâneo de Marx e Engels, frequentava as gauguettes (espaços boêmios) para ter momentos de descontração, difundir seus textos e discutir ideias revolucionárias. Exilado na Inglaterra, permaneceu lá por alguns anos até a anistia política em 1860. De volta a Paris, conheceu Nodeau que financiou seu livro Quem é o louco? – publicado em 1887 – no qual se encontra a Internacional, composta em 1871. Pierre Degeyter, responsável por musicar a letra de Pottier, não chegou a conhecê-lo.

A Internacional, hino também da União Soviética quando esta foi constituída, é aclamado por comunistas, socialistas, com traduções em várias línguas. No Brasil, representou a unidade da classe desfavorecida do proletariado.

A relevância das mulheres na Comuna

Claudine Rey, Diana Assunção (Agrupação de mulheres Pão e Rosas) e Mirla Cisne (UERN/Consulta Popular) expuseram a dura realidade que viveram as mulheres –  fome, frio, intensas jornadas de trabalho e prostituição. Como declarou Rey, o pensamento da época era que “sem o homem, as mulheres não poderiam sair da bestialidade”. No entanto, contrapondo corajosamente esse posicionamento, a participação feminina na Comuna de Paris foi de luta e grande significação. Muitas cuidaram dos feridos nas barricadas, enfrentaram preconceitos, foram reprimidas e morreram. Como declarou Mirla, “elas abriram mão de privilégios e esse é um dos fatores mais revolucionários”.

Ao lembrar a Comuna de Paris de 1871, o seminário ilustrou o acontecimento histórico e demonstrou a força do povo. Reavivando a luta por ideais, ficou perceptível que, com a união, é possível promover modificações na sociedade.


Andrey Raychtock, Isabella Catão, Luís Felipe Sá e Yara Lopes

Estagiários de jornalismo

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