“A Universidade é o maior centro cultural da cidade”

Na sexta (07/06), último dia do I Encontro de Arte e Cultura, o Salão Pedro Calmon recebeu os pesquisadores Guilherme Aderaldo, Renato Emerson e Fernanda Sánchez (foto acima), para debater os espaços urbanos e a cultura como instrumentos de resistência, na mesa Arte e Cidade.

Na sexta (07/06), último dia do I Encontro de Arte e Cultura, o Salão Pedro Calmon recebeu os pesquisadores Guilherme Aderaldo, Renato Emerson e Fernanda Sánchez (foto acima), para debater os espaços urbanos e a cultura como instrumentos de resistência, na mesa Arte e Cidade.

O debate foi mediado pelo coordenador do FCC, Carlos Vainer, que é também professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ). Prevista em um dos eixos da Política Cultural da UFRJ, – Conexões Urbanas, a aproximação entre universidade e cidade é tida como crucial para ampliar e fortalecer iniciativas culturais, tanto dentro como fora do espaço universitário. “A Universidade é o maior centro cultural da cidade. Mas ela ainda não se enxerga dessa maneira. Assim como a cidade também não a enxerga. É preciso mostrar que a universidade não é um instituto tecnológico, que está muito além disso”, defendeu Vainer.

O papel da cultura para a cidade vai muito além do entretenimento e lazer, como mostrou Fernanda Sánchez, pesquisadora da Escola de Arquitetura e Urbanismo (EAU) da Universidade Federal Fluminense (UFF).  A pesquisadora tratou dos processos de transformação urbana na cidade do Rio de Janeiro, realizados na última década, em específico as intervenções ocorridas na Zona Portuária da cidade, com a criação do Porto Maravilha, Museu do Amanhã, Museu de Arte do Rio, o VLT, entre outros projetos. Sánchez observou a importância da atuação de movimentos e grupos culturais em tais espaços, não apenas em defesa da permanência e do direito aos espaços físicos, mas no que diz respeito ao embates simbólicos.

Fernanda citou o bloco carnavalesco Afoxé Filhos de Gandhi e a escola de samba Vizinha Faladeira como exemplos de organizações e coletivos artístico-culturais que têm atuado como resistência na região, procurando resgatar a herança histórica, a memória e a cultura dos negros que se forjaram nos bairros da zona portuária e central da cidade. “Transformar os sentidos da área tem sido uma operação simbólica perseguida e importante para o processo de transformação urbana”, afirmou.  

Além de sinalizar o valor da cultura como instrumento de resistência, Fernanda observou que a problemática das reformas e reapropriações dos espaços urbanos tem marcadamente um recorte racial. “Não há nesses espaços, apenas processos de violência simbólica e gentrificação. Trata-se também de um processo de “embranquecimento do território” da área portuária”, termo de autoria do geógrafo e professor do IPPUR/UFRJ, Renato Emerson, um dos componentes da mesa.

Para Renato, é preciso compreender de que modo o racismo se espacializa na cidade. Segundo ele, o racismo deve ser entendido como um sistema multidimensional de dominação, que articula todas as escalas da existência e relações sociais, em todas as dimensões: da escala-mundo ao corpo, o que inclui pensar também a escala do espaço urbano.  

“As relações raciais acontecem no espaço, com o espaço e grafam o espaço”, explicou. Nesse sentido, além de formas de resistência, as ações culturais, podem ser utilizadas como ferramenta para enxergar as divisões e marcações raciais existentes na cidade, na tentativa de interferir em tais dinâmicas.  

O antropólogo Guilherme Aderaldo, da USP, lembrou que os espaços não devem ser pensados como superfícies mapeáveis e engessadas. A cidade, por exemplo, não deve ser entendida com o que ela é, mas o que a faz ser cidade. Segundo o pesquisador, “percepções cotidianas são influenciadas por representações cartográficas, que influenciam nossa produção de sentido”. Sua proposta tem sido a de buscar, a partir do chamou de “contramapas”, isto é, cartografias alternativas aos mapeamentos convencionais, a potência de novas narrativas, capazes de ressignificar conceitos como cidade, centro, periferia, entre outros.

Para os pesquisadores, as práticas culturais e artísticas seriam, portanto, ações de resistência e dispositivos de luta na construção de novas narrativas sobre a cidade e sua gente. “A arte perpassa essa luta pelos espaços e reapropriações”, observou Marilane Abreu Santos, professora de artes visuais do Colégio de Aplicação da UFRJ e uma das espectadoras do debate. “Devemos entender a cultura como um campo de batalha e como arma urbana. A cultura como barricada urbana: local onde podemos resistir”, finalizou Vainer.


Texto: Victor Terra 
Fotografia: Eneraldo Carneiro

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