Entrevista com Márvio dos Anjos
“O poeta sempre escuta um convite para o diálogo com o passado” Márvio dos Anjos será um dos artistas participantes do Sarau de Avatares e Heterônimos que acontecerá no ArteForum e encarna muito bem a multiplicidade a que se propõe o evento. Ele é jornalista,…
Márvio dos Anjos será um dos artistas participantes do Sarau de Avatares e Heterônimos que acontecerá no ArteForume encarna muito bem a multiplicidade a que se propõe o evento. Ele é jornalista, editor do jornal Destak, poeta e cantor da banda de glam rock Cabaret. Nessa entrevista, o sobrinho bisneto de Augusto dos Anjos fala da conexão entre os diferentes trabalhos que exerce e a convivência entre as novas e velhas formas de se fazer literatura.
ANA BEATRIZ PESSANHA
Estagiária de Jornalismo do FCC/UFRJ
1. FCC – Como será sua participação no sarau?
MA – Participarei interagindo com três vídeos, que refletem algumas das minhas questões como jornalista, poeta e cronista.
2. FCC – Como você vê essa intervenção tecnológica na poesia, como a proposta do sarau?
MA – Acho que é uma maneira de injetar novo interesse na cultura de sarau, que sempre sofre de certa má fama. Saraus sempre são um convite para chatos, muitos rolam sem curadoria e a coisa se perde. E há um interesse crescente em performances e vídeo-instalações. Se essas formas servirem de acessório para o alcance da poesia, não vejo porque não empregá-las.
3. FCC – Você utiliza os novos recursos digitais na sua produção literária? De que forma?
MA – Bom, para começar, escrevo em computador (risos). E acho que a vida digital é parte da nossa experiência de percepção. A fragmentação e a descontinuidade que a gente experimenta ao viver com várias janelas nos convidam a fragmentar e descontinuar também na literatura. Eu acredito que traços de comportamento influem em traços de criação. Mas não vejo na minha produção mais empregos além desses que citei. Claro, existe a divulgação, já que publico na internet desde 2001.
4. FCC – Como você acredita que as antigas formas de produção poética, como os sonetos, por exemplo, sobrevivem hoje?
MA – Sobrevivem porque são sedutoras. Elas remontam à época em que a poesia era relevante. Acho que o poeta sempre escuta um convite para o diálogo com o passado. O soneto está para a poesia como a sinfonia está para a música clássica, como o conto está para a prosa, como a canção pop (aquela com estrofe-refrão-estrofe-refrão-ponte-refrão) está para o rock: são formatos. Mais que testar esses formatos, nós artistas somos testados por eles. Dominar os formatos para depois quebrá-los sempre me pareceu um ótimo aprendizado. Você ganha consciência sobre o que faz.
5. FCC – Além de poeta, você é jornalista e músico. Como os seus trabalhos se influenciam mutuamente?
MA – Eu diria que eles se tolhem mutuamente. Porque a vida como jornalista toma muito tempo. Mas o jornalismo me ensina a ser mais direto, cortar palavras, assim como a métrica na poesia. Acho que tudo se reflete mutuamente, num determinado tom semelhante na linguagem escrita. Na canção, não saberia dizer. Mas, cortar palavras é algo que eu faço sem medo porque a poesia me ensinou e o jornalismo refinou.
6. FCC – O parentesco com Augusto dos Anjos influenciou de alguma forma a sua criação literária?
MA – Acima de tudo, saber que eu tinha um tio-bisavô ilustre me incentivou a ler e a tentar a poesia. Depois, ensinou na prática a necessidade de tentar ser relevante, buscar contribuir com algo necessário, sair dos lugares comuns sempre que possível.