Os entraves para alcançar a soberania sanitária
Pesquisadores e especialistas acreditam que a autonomia sanitária é uma necessidade e o processo passa por inovação e demandas básicas de saúde
Sob mediação da professora Magdalena Rennó (NUPEM/UFRJ), especialistas se reuniram para debater os desafios da soberania sanitária, um dos temas presentes na série de encontros Bicentenário da Independência e os rumos do Brasil, realizado pelo Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, em celebração ao dia 7 de setembro. A emergência sanitária, que ainda está muito presente na memória e na vida de cada um, em razão da pandemia da covid-19, evidenciou que o debate passa pelas dificuldades enfrentadas pelo Sistema Única de Saúde (SUS) e como a inovação pode ajudar a garantir o acesso à saúde como direito universal no Brasil.
Participaram da mesa, como painelistas convidados, o ex-ministro da Saúde e pesquisador da Fiocruz, José Gomes Temporão, a professora do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Gulnar Azevedo e Silva, a professora e pesquisadora em saúde da UFRJ, Lígia Bahia, e o pesquisador da Fiocruz, Paulo Gadelha.
Durante os últimos dois anos, o Brasil expôs a dependência para fornecimento de equipamentos, materiais, produtos e insumos para promover a saúde como direito social. Segundo Temporão, esses momentos escancaram a real necessidade de refletir sobre a autonomia de cada país no desenvolvimento de tecnologias voltadas para a saúde.
“Ficou bastante evidente durante esses anos pandêmicos, de 2020 para cá, onde se expressou de maneira dramática a imensa dependência do país de insumos e de tecnologias produzidas no exterior. É necessária uma política de estado para o fortalecimento do complexo industrial da saúde, que nos permita a construção de uma base produtiva e tecnológica nacional”, afirmou Temporão.
A inovação e o desenvolvimento de novas tecnologias se tornaram questões-chave para enfrentar a crise sanitária. Paulo Gadelha, pesquisador da Fiocruz, também lembrou que a presença do estado teve papel tático nesse processo de enfrentamento da pandemia.
“Interessante observar como houve um aprendizado grande de novas formas de trabalhar. Inovação orientada para a missão, plataformas comuns, inovações regulatórias e ao mesmo tempo do estado empreendedor. Passa-se a reconhecer uma condição fundamental, pois conseguimos a capacidade de romper uma fase inicial mais crítica na inovação tendo a presença do estado”, disse Gadelha.
Doente, saúde pública no país carece de investimentos
O uso político ao longo do período de pandemia e questões ideológicas deram o tom negativo diante de um momento de insegurança para a população. Na avaliação da pesquisadora e professora Lígia Bahia, é preciso construir um projeto que transcenda os interesses dos governantes:
“A preocupação é que a saúde pública tem uma vinculação muito grande com os governos, e precisamos ter autonomia. Bandeiras do momento não substituem um projeto científico embasado, com metodologia sólida, que busque encontrar hipóteses explicativas para a melhoria do sistema”, alertou Bahia.
Observando especificamente os aprendizados com o sistema brasileiro, a professora Gulnar Azevedo e Silva destacou outros aspectos a serem considerados, mas reforçou a importância da construção de um modelo de saúde como prioridade.
“A saúde não vai conseguir se desenvolver apenas com base em ativismo. Muitas outras áreas também precisam de solução, mas precisamos de um compromisso com o SUS, que precisa ser fortalecido e aprimorado”, disse a pesquisadora.
A mesa Desafios da soberania sanitária foi transmitida no canal do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, no YouTube. Os outros encontros também estão disponíveis na plataforma.