Um novo sotaque para falar de cinema
Depois do Ceará, foi a vez de Pernambuco aportar no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ e mostrar que o Nordeste também é cena de cinema. Após realizar uma mostra com jovens cineastas cearenses, o Fórum recebeu na semana de 18 a 22 de…
Depois do Ceará, foi a vez de Pernambuco aportar no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ e mostrar que o Nordeste também é cena de cinema. Após realizar uma mostra com jovens cineastas cearenses, o Fórum recebeu na semana de 18 a 22 de outubro a Mostra do Cinema Pernambucano Contemporâneo.
Sempre às 19 horas, o público pôde conhecer um total de 10 filmes que representam a nova produção dos cineastas pernambucanos. Na quinta, foram exibidos cinco curtas, dentre eles, três do diretor Kleber Mendonça Filho, SuperBarroco de Renata Pinheiro e O Muro de do cineasta Tião. Após a sessão aconteceu um debate com a professora de cinema do curso de Rádio e TV da ECO/UFRJ, Kátia Maciel.
Kátia não foi um simples olhar acadêmico e estrangeiro sobre os filmes. Também pernambucana e cineasta, a professora ressaltou os aspectos singulares da produção de cinema em Pernambuco. Segundo Maciel, nove em cada dez filmes são feitos sob o que no meio cinematográfico é chamado de brodage. Esse é um sistema para filmes de orçamento zero, em que tudo é feito à base da amizade, sem contratações profissionais ou patrocínio.
A maioria dos jovens cineastas pernambucanos veio do curso de Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco e levaram o sistema de produção de amigos da faculdade para além dos muros da Universidade.
Segundo Kátia é esse coletivo que faz a força do cinema pernambucano, onde os realizadores estão interligados. No entanto, ela alerta que muitas vezes a brodage pode virar desculpa para o amadorismo e falta de qualidade. Mas esse com certeza não foi o caso dos filmes exibidos na Mostra, nem de grande parte do cinema pernambucano, que vem ganhando o mundo com festivais e concursos internacionais.
Na visão do pesquisador Roberto Guerra, citado por Maciel, o cinema de Pernambuco busca acessar questões locais, utilizando uma abordagem universal. Abordagem essa, dona de uma liberdade de experimentação muito bem explorada pela nova geração, que não se apega a modelos e velhas formas de filmagem. Um exemplo é que os novos cineastas já não se prendem à antiga câmera 35mm, filmam em câmera digital e depois convertem o modelo, afirmou Kátia.
E a inovação não estaciona por aí. É também na linguagem cinematográfica que ela se mostra.Filmes como o do cineasta Tião vão em busca do inusitado, do incomum e pouco se preocupam com fórmulas de início-meio-fim. Apesar da inventividade típica da vanguarda que muitas vezes milita no radicalismo e afasta o público, Maciel acredita não ser esse o caso do cinema de Pernambuco, que encontra o diálogo com os espectadores.
O debate atravessou o país e veio parar no cinema carioca. Os estudantes presentes discutiram como o modo de fazer pernambucano pode se encaixar às realizações do Rio e ao mesmo tempo, como a universidade pode exportar a experiência coletiva de fazer cinema, comum à faculdades do Rio e Pernambuco.Os jovens cineastas dizem fazer filmes para pensar. Nas reflexões que se abrem para a tela, revolvem as próprias feridas, com filmes de crítica à classe média e alta, da qual a maioria pertence. Ao comentar sobre Pacific, filme de Gabriel Mascaro, um dos maiores expoentes do cinema pernambucano, Kátia afirma: “É uma porrada na classe alta.”
E é assim, entre brutalidades e delicadezas que a cena cinematográfica de Pernambuco vem desbravando espaços para contar as próprias histórias, não como a realidade vitimizada e distante, mas como a imagem que revela e aproxima.
MARIA EDUARDA PAIXÃO
ANA BEATRIZ PESSANHA
Estagiárias de Jornalismo FCC/UFRJ